segunda-feira, 24 de outubro de 2016

A gramática e o poeta...

Vamos curtir o poema enquanto aguardamos as surpresas/brincadeiras do Núcleo.

 

De Gramática e de Linguagem 

*Mário Quintana


E havia uma gramática que dizia assim:
"Substantivo (concreto) é tudo quanto indica
Pessoa, animal ou coisa: João, sabiá, caneta".
Eu gosto das coisas. As coisas sim!...
As pessoas atrapalham. Estão em toda parte. Multiplicam-se em excesso.

As coisas são quietas. Bastam-se. Não se metem com ninguém.
Uma pedra. Um armário. Um ovo, nem sempre,
(Ovo pode estar choco: é inquietante...)
As coisas vivem metidas com as suas coisas.
E não exigem nada.
Apenas que não as tirem do lugar onde estão.
E João pode neste mesmo instante vir bater à nossa porta.
Para quê? Não importa: João vem!
E há de estar triste ou alegre, reticente ou falastrão,
Amigo ou adverso...João só será definitivo
Quando esticar a canela. Morre, João...
Mas o bom mesmo, são os adjetivos,
Os puros adjetivos isentos de qualquer objeto.
Verde. Macio. Áspero. Rente. Escuro. luminoso.
Sonoro. Lento. Eu sonho
Com uma linguagem composta unicamente de adjetivos
Como decerto é a linguagem das plantas e dos animais.
Ainda mais:
Eu sonho com um poema
Cujas palavras sumarentas escorram
Como a polpa de um fruto maduro em tua boca,
Um poema que te mate de amor
Antes mesmo que tu saibas o misterioso sentido:
Basta provares o seu gosto.
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 * Mário Quintana - Pura delícia!

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